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Muito além da gestão

O que os executivos buscam hoje em experimentos que vão das artes plásticas à astrofísica não é muito diferente do que o músico propunha.

Quando Jimi Hendrix perguntou em seu primeiro disco em 1967: "Are You Experienced?", provavelmente o guitarrista estava se referindo às experimentações psicodélicas que despontavam naquele momento de grandes transformações socioculturais. O que os executivos buscam hoje em experimentos que vão das artes plásticas à astrofísica não é muito diferente do que o músico propunha. Eles querem entender um mundo em movimento onde a tecnologia, a economia criativa, as redes colaborativas e a nova divisão de forças no planeta geram desafios inusitados para a gestão.

Com o propósito de tirar os executivos da zona de conforto e pensar sobre esses temas e uma gestão contemporânea à brasileira, a Fundação Dom Cabral montou o curso "FDC Experience". Com ele, a instituição segue os passos de escolas de negócios renomadas como Stanford e Harvard que incluíram as artes e ciências humanas no ensino de liderança.

Em quase dois dias, 300 profissionais de vários estados brasileiros, de áreas diversas, que ocupam cargos de gestores em suas companhias, experimentaram na sede da FDC em Nova Lima (MG) situações que aparentemente não têm muito a ver com administração. Eles pintaram, grafitaram, fizeram caleidoscópios, jogaram xadrez, videogame e ouviram palestras de filósofos, físicos e pensadores. Entre um rabisco e uma surpresa, pensaram sobre o modo como podem dirigir melhor suas empresas em um cenário de mudanças constantes.

"É bom poder sair um pouco da pressão do dia a dia. As ideias surgem quando vemos coisas diferentes", diz Rosana Martins, vice-presidente de recursos humanos da Schneider Electric. Ela foi uma das participantes de uma experiência onde todos entravam em uma sala escura, vendados, para discutir legado e a importância das conexões sociais. "Não pensava muito sobre a morte antes daqui."

O objetivo do programa, segundo Roberto Sagot, diretor executivo da FDC, é justamente trabalhar com a subjetividade. "Para fazer gestão hoje não se pode considerar apenas os aspectos cartesianos", explica. As empresas têm hoje várias gerações convivendo sob o mesmo teto, onde pessoas de diferentes culturas atuam no mesmo negócio. "O desafio é muito mais comportamental. É saber trabalhar junto". A parte lúdica do programa, segundo ele, é inspirada em museus e exposições de arte. "Brincar é coisa séria". O professor Ricardo Carvalho ressalta: "Apenas 3% dos insights criativos acontecem no escritório."

A empresária Alayde Garcia, de 68 anos, dona do frigorífico Vitello, veio do Amazonas com a filha para participar do curso. Ela fez grafite virtual e topou todas as propostas do programa. "Quero quebrar preconceitos, me desarmar e conhecer o novo. Ainda me sinto muito disposta a continuar trabalhando", diz. Esse espírito de aventura juntou cabelos brancos e jovens em discussões acaloradas sobre temas diversos como o futuro do mercado editorial, das cidades e até do empreendedorismo social.

A tecnologia, inevitável e desafiadora, foi um assunto recorrente nos debates por preocupar tanto os jovens quanto os mais velhos, ainda que por diferentes razões. "Mais de 40% dos adolescentes americanos poderiam mandar uma mensagem de texto de olhos vendados", afirma Luli Radfahrer, um dos palestrantes. Para os jovens, é fácil perder o controle do tempo diante das inúmeras possibilidades e ferramentas tecnológicas. Os mais experientes, por sua vez, ainda se amedrontam diante da rapidez com que precisam se atualizar. "Digerir o Facebook é como entrar em uma longa estrada sem saída", disse um participante.

Um labirinto mostrava fotos, vídeos e textos sobre a história do Brasil e a evolução da gestão moderna. Nele, obras sem legendas conduziam ou confundiam sensorialmente o participante no trajeto até uma sala para reflexões. Em um único ambiente estavam Andy Warhol, Caetano Veloso, Max Weber, Peter Drucker e Clarice Lispector. "Quando o caminho é sinuoso, precisamos pensar mais para tomar a decisão certa", disse um executivo ao fim do percurso.

A maneira como os brasileiros administram os negócios, com flexibilidade e improviso, é ressaltada em várias plenárias como um exemplo para os dilemas da gestão moderna. Em uma sociedade que se conecta cada vez mais em um emaranhado de redes, a experiência do país na maneira como organizamos as coisas pode ser valiosa. "Conhecemos isso muito bem porque estamos habituados a lidar com a complexidade", diz a filósofa Viviane Mosé. Na conclusão do curso, o moderador afirma que o modelo de gestão está mudando, mas não existe uma fórmula a ser seguida nesse momento. "É preciso levar as interrogações para casa."

Enquanto termina seu segundo quadro, em um espaço reservado à pintura, pouco antes do fim do programa, o consultor Geraldo Pontes, da Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (Fiemig), diz que ficou feliz ao perceber o otimismo em relação ao papel que o Brasil pode exercer nessa nova força de encarar a gestão. "É o momento de se quebrar paradigmas para acompanhar essas mudanças", afirma. "Acho que é isso que vou dizer para o pessoal do trabalho amanhã."

A jornalista viajou a convite da FDC

 

A arte entra para o currículo dos cursos de MBA

Por Rebecca Knight

Quando Garrett Koehn começou sua busca por um programa de MBA executivo, não conseguiu encontrar o que procurava. Koehn, que é presidente da divisão da companhia de seguros Crump Group para o Noroeste dos Estados Unidos, queria se atualizar sobre a economia mundial, mas também reciclar seus conhecimentos sobre cultura e história.

No ano passado, Koehn se matriculou em um novo programa oferecido pela IE Business School da Espanha e pela americana Brown University, que combina ciências humanas e sociais com o tradicional ensino de administração. "As artes liberais acrescentam um contexto político, social e cultural ao que acontece nas finanças", diz. Koehn não está sozinho na busca de um ensino de negócios mais abrangente e as escolas estão percebendo isso.

Abaladas pelas críticas em razão do papel que desempenharam na crise financeira - formando alunos que se concentravam apenas em ganhar dinheiro -, algumas escolas de negócios estão dando ênfase a disciplinas associadas às artes. A Rotman School of Management da Universidade de Toronto, por exemplo, reorganizou seu currículo para estimular a capacidade dos alunos de inovar. Já a Stanford Graduate School of Business fez mudanças que deram mais peso às perspectivas multidisciplinares e aos contextos culturais.

A maior ênfase nas artes é um reconhecimento de que o currículo tradicional de MBA tem deixado a desejar. Muitos dos maiores empregadores dos MBAs recém-criados têm mudado a maneira com que buscam talentos, valorizando habilidades que vão além de finanças e contabilidade. Em 1993, 61% dos novos contratados da McKinsey tinham MBA; em 2006, esse número caiu para 43%. "As companhias perceberam que estavam começando a perder a vantagem na criatividade e na resolução de problemas. Assim, passaram a contratar também arquitetos, engenheiros e advogados", diz Stuart Kaplan, diretor da Korn/Ferry. "Eles estão vendo menos relevância no MBA tradicional."

Em uma era em que os mercados financeiros são interconectados e a inovação tecnológica ocorre em ritmo acelerado, o perfil dos profissionais também mudou. "Estamos nos afastando dos gestores do tipo que comanda e controla, em direção a líderes abordam os problemas de perspectivas diferentes", diz James Spohrer, diretor dos programas universitários da IBM. Para ele, os contratados com experiência em artes liberais "tendem a ter uma escrita excelente, melhor comunicação e uma probabilidade maior de serem criativos".

O programa da IE/Brown envolve aulas nas duas instituições, além de trabalhos on-line. O currículo traz uma aula de artes que explora a história do hip-hop, uma de teatro para ajudar os alunos a aperfeiçoar a comunicação em público e outra de filosofia sobre o significado do trabalho e da identidade. "Elas dão aos alunos uma chance de engajamento no processo criativo. O fato de ser divertido não significa que não sirva a um propósito", diz David Bach, responsável pelo programas.

Entretanto, Roger Martin, reitor da Rotman, diz que os programas de artes podem ser um "pouco autocomplacentes", pois falham no mais difícil: "As escolas não ensinam as pessoas como pensar sobre esses assuntos e nem a estruturar e resolver problemas cognitivos."


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