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Novo balanço torna mais explícito o risco do FIDC

Norma da CVM vai ainda colocar cota sênior no passivo

 

As novas regras contábeis a serem aplicadas pelos Fundos de Investimento em Direitos Creditórios (FIDCs) darão mais transparência para o investidor a respeito do tipo de risco de crédito assumido por ele. Muitas vezes, ao comprar uma cota de FIDC, o investidor acredita estar correndo o risco de crédito do conjunto dos recebíveis da carteira, quando, na realidade, está sujeito ao risco de pagamento da empresa ou banco que vendeu aqueles recebíveis.

Outra novidade é que algumas cotas seniores dos fundos (aquelas de menor risco) poderão ser classificadas, para fins de demonstração financeira, como parte do passivo do fundo, ampliando a possibilidade de cobrança pelo investidor, em caso de problemas de solvência. Atualmente, todas as cotas compõem o patrimônio do fundo, o que significaria o direito de receber rendimentos e o principal somente se sobrar dinheiro após o pagamento das dívidas.

A partir de agosto, os FIDCs terão que separar, em duas linhas do ativo, os direitos creditórios comprados com aquisição dos riscos e benefícios daqueles que não carregam riscos e benefícios.

A determinação para essa classificação consta da Instrução nº 489, publicada na sexta-feira pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM), que tem como objetivo tornar as regras de contabilidade aplicadas aos fundos de recebíveis compatíveis com as usadas pelas companhias abertas, que passaram a seguir desde 2010 o padrão internacional IFRS.

"Se há cessão de direito creditório, mas, em caso de inadimplência, o cedente se responsabiliza, independentemente do instrumento, do ponto de vista econômico não está havendo uma venda [do direito de crédito]", sintetiza José Carlos Bezerra, gerente de normas contábeis da CVM, lembrando que a contabilidade internacional está baseada no conceito de que a essência econômica deve prevalecer sobre a forma jurídica.

Assim, quando um fundo compra uma carteira de crédito, mas não os riscos e benefícios ligados a ela, isso significa que o investidor cotista está exposto, em última instância, à capacidade de pagamento do cedente, e não a uma eventual inadimplência do conjunto de tomadores daqueles empréstimos. "Aquela pulverização de risco deixa de existir. Há uma concentração de risco", explica Silbert Sasdelli, sócio da área de serviços financeiros da KPMG no Brasil.

Essa evidenciação, na opinião do sócio-líder da mesma área da KPMG, Ricardo Anhesini, deve levar à criação de estruturas de securitização com mais casos de transferência efetiva de riscos e benefícios e isso terá reflexo também nos preços, ou taxas de retorno. "As estruturas de hoje têm risco de crédito residual (para o comprador de cotas seniores). Agora deve começar a ter mais risco de crédito."

Uma mudança na composição das carteiras também terá impacto do lado dos compradores de cotas de FIDCs. "Quando passa a ter um mix com mais risco de crédito, o tipo de investidor que o fundo vai atrair e o nível de informação que precisa ser divulgada passam a ser diferentes", diz Anhesini.

Em relação à possibilidade de classificação de algumas cotas seniores dentro do passivo dos fundos, e não no patrimônio (ponto bastante contestado na audiência pública conduzida pela CVM), o sócio-líder da KPMG para serviços financeiros disse que "esse é, sem dúvida alguma, o ponto mais polêmico" da norma.

Segundo Bezerra, da CVM, isso terá de ser analisado caso a caso, mas pode ocorrer quando a cota sênior tiver, por exemplo, uma remuneração pré-determinada, como um benchmark, e qualquer rentabilidade acima disso não for distribuída para ela. Da mesma forma, quando, em caso de prejuízo, a cota sênior não for afetada, ficando toda a perda para o detentor da cota subordinada.

Anhesini admite que alguns investidores podem interpretar isso como de fato uma obrigação de remuneração, ou renda garantida. "Essa é uma preocupação que existe. Como firma, a KPMG ainda não se posicionou a respeito. Mas pode ter impacto que teria de ser discutido no âmbito jurídico", diz.

De qualquer forma, o especialista ressalta que entende que, tanto do ponto de vista normativo, como do lado jurídico, as cotas continuam sendo vistas como itens do patrimônio do fundo, como num condomínio. A norma da CVM muda apenas a forma de divulgação nas demonstrações financeiras. Ele lembra ainda que, se a perda exceder o colchão de garantias da cota subordinada, a cota sênior continua exposta a risco de crédito.

Outros dois pontos relevantes da nova regulamentação estão ligados às provisões para perdas e à divulgação de informações.

Em relação ao primeiro item, os sócios da KPMG destacam o fato de a norma determinar que as provisões sejam feitas conforme a perda esperada da carteira e não pelo critério de perda incorrida. Ao fazer isso, a regra se antecipa ao IFRS, uma vez que o padrão internacional ainda usa perda incorrida, mas vai migrar para o modelo de inadimplência esperada em breve.

Sobre as divulgações, Silbert Sasdelli chama atenção para a obrigatoriedade de divulgação das recompras de carteira realizadas pelo cedente e também das taxas usadas na cessão.

 


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