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Prazo para recuperar imposto é alterado

Carf entende que tempo começa a correr com o recolhimento

Luiza de Carvalho

O fisco começa a reverter a seu favor entendimento consolidado na instância administrativa tributária em relação ao prazo para se ajuizar as ações de repetição de indébito - aquelas em que o contribuinte pede a devolução de quantia paga indevidamente. Em recentes julgamentos, a 3ª Turma da Câmara Superior do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), antigo Conselho de Contribuintes, decidiu que o prazo para pedir a restituição vence em cinco anos após o recolhimento indevido, conforme determina a Lei Complementar nº 118, de 2005. Até então, o órgão entendia que o prazo era de até cinco anos após uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que tenha declarado a inconstitucionalidade da cobrança - como ocorreu, por exemplo, no caso do Fundo para Investimento Social (Finsocial). O principal impacto da mudança se dará em ações de grande valor que pleiteiam a restituição da Cota de Contribuição ao Instituto Brasileiro do Café (IBC).

A chamada "cota-café" foi instituída pelo Decreto-Lei nº 2.295, de novembro de 1986, que isentou do imposto de exportação as vendas de café para o exterior. O tributo foi cobrado até 1992. O valor da cota, cuja incidência variava conforme a saca (60 quilos) de café comercializada, era fixado pelo presidente do IBC e destinada ao Fundo de Defesa da Economia Cafeeira, gerido pelo Ministério da Indústria e do Comércio.

Em 1997, o Supremo declarou inconstitucional a cobrança feita entre 1989 e 1992, o que deu origem a centenas de contestações na Justiça para reaver o valor. Em abril de 2004, em novo julgamento, a corte considerou a cobrança novamente inconstitucional, estendendo a decisão à contribuição cobrada entre 1986 e 1988, período bem mais interessante para o setor, pois houve um volume maior de exportação.

Apesar das mudanças na jurisprudência do STJ durante os últimos anos, o antigo Conselho de Contribuintes mantinha, até agora, o posicionamento de que o pedido de restituição de valores pagos a maior poderia ser ajuizado até cinco anos após a declaração de inconstitucionalidade pelo Supremo - o que, no caso da cota-café, se deu em 2004. Os exportadores defendiam, portanto, que a restituição poderia ser pleiteada até 2009, mantida a jurisprudência. Este semestre, no entanto, sob uma nova composição, a Câmara Superior do Carf começou a aplicar a Lei nº 118, no sentido de que o direito ao crédito estaria extinto após cinco anos de seu pagamento.

Um dos primeiros recursos em que o entendimento foi inaugurado na Terceira Turma da Câmara Superior do Carf - que analisa a maioria das ações de repetição de indébito que chegam ao órgão - foi dado em um processo sobre o Finsocial. Em dezembro de 1992, o plenário do Supremo declarou inconstitucionais as alíquotas que ultrapassassem 0,5 % do faturamento das empresas comerciais e industriais. No dia 7 de julho, ao analisar um pedido de restituição ajuizado em 1997 - dentro do prazo de cinco anos após o julgamento do Supremo -, referente aos pagamentos feitos no período de setembro de 1989 a outubro de 1991, a Terceira Turma do Carf declarou o direito prescrito, favorecendo a Fazenda Nacional.

De acordo com o voto do conselheiro Henrique Pinheiro Torres, relator do recurso, os órgãos judicantes da administração não têm competência para, por suas turmas e câmaras, exercer o controle da constitucionalidade. Ou seja, segundo essa visão, o Carf não poderia deixar de aplicar a Lei nº 118, a despeito de toda a discussão no Judiciário sobre a sua aplicação. Segundo Paulo Riscado, coordenador da atuação da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) no Carf, a mudança de entendimento do Carf tem maior reflexo, principalmente, nas ações sobre a cota-café, nas quais, segundo ele, o entendimento já está sendo aplicado em outros julgamentos pela Câmara Superior do Carf. "As ações de restituição de cota-café envolvem valores milionários, e a nova posição do Carf pode fazer a Fazenda economizar bilhões", diz Riscado.

A mudança no Carf não foi bem recepcionada entre os advogados que atuam na área. "As decisões tributárias em âmbito administrativo não estão hierarquicamente submetidas às decisões do Poder Judiciário", diz o advogado Marcos Joaquim Gonçalves Alves, do Mattos Filho Advogados.

Na opinião do advogado Flávio Eduardo Carvalho, do escritório Souza, Schneider e Pugliese Advogados, a decisão mais coerente seria manter a jurisprudência antiga da casa ou aplicar o entendimento do STJ pela não irretroatividade da lei complementar nº 118. "Em muitos casos, o prejuízo ao contribuinte é enorme", diz Carvalho. Segundo o advogado Albert Limoeiro, consultor tributário em Brasília e que atua no Carf, a aplicação retroativa da Lei Complementar nº 118 ofende princípios constitucionais, como o da irretroatividade da lei para prejudicar o direito adquirido. Contexto

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) entendia, até 2004, que o prazo para se pleitear a restituição dos valores recolhidos indevidamente era de cinco anos após a declaração de inconstitucionalidade pelo Supremo Tribunal Federal (STF) ou de uma resolução do Senado. Mas, naquele ano, o STJ mudou sua posição para aplicar a conhecida tese dos "cinco mais cinco anos", pela qual o direito prescreve após dez anos do pagamento do tributo. Por esse entendimento, no caso da cota-café, apenas ações ajuizadas até 1998 poderiam pleitear a restituição da cota paga entre 1986 e 1988. Em 2005, no entanto, a Lei Complementar nº 118 reduziu o prazo para cinco anos. O último entendimento proferido pelo STJ foi pela não retroatividade da lei, ou seja, o novo prazo não poderia ser aplicado às ações que estavam em andamento quando a norma entrou em vigor. Com isso, o STJ decidiu pela inconstitucionalidade de um dos artigos da lei, que previa sua aplicação retroativa. A questão ainda está pendente de julgamento em um recurso no Supremo Tribunal Federal.


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