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Anistia de dívidas custa R$ 3,6 bilhões

Marcelo BeledeliQuem está devendo para o governo federal ganhou uma boa notícia neste mês de dezembro. Publicada no Diário Oficial da União do dia 4, a Medida Provisória 449 estabelece anistia às dívidas de contribuintes com a União adquiridas até 1 de dezembro de 2003 e cujos valores, em 31 de dezembro de 2007, tenham sido iguais ou inferiores a R$ 10 mil. A medida é válida mesmo que os débitos estejam em processo de execução judicial, em cobrança administrativa ou com exigibilidade suspensa por qualquer meio. Segundo o procurador-geral da Fazenda Nacional, Luiz Inácio Adams, o benefício vai atingir 453 mil pessoas físicas e 1,6 milhão de empresas. Segundo dados divulgados pelo Ministério da Fazenda, existem 2,1 milhões de dívidas passíveis de perdão, que significam cerca de 18% de todos os processos inscritos em dívida ativa da União. O valor total dos débitos que serão perdoados chega a R$ 3,6 bilhões, representando menos de 0,5% de toda a dívida ativa da União, que é superior a R$ 1,3 trilhão.Além disso, a medida possibilita a redução de multas e juros para as dívidas com a Fazenda Nacional vencidas até 31 de dezembro de 2007. Esses débitos, também até o valor de R$ 10 mil, poderão ser pagos à vista ou parcelados. Se o contribuinte optar por pagar à vista, ou em até seis prestações mensais, fica isento de multas e terá redução de 30% nos juros. No pagamento em 30 parcelas, o desconto será de 60%, mas as multas permanecem. Já no parcelamento em 60 prestações, o valor das multas cairá 40%.No entanto, há quem classifique este perdão como um incentivo à inadimplência. "Quem procurou pagar seus débitos em dia se sente prejudicado e com razão", afirma o contador João Roberto Pinto, gerente da empresa de assessoria tributária Tecmac. De acordo com ele, a nova medida cria uma situação paradoxal, onde são perdoados débitos que, na realidade, não existem. "Uma dívida minha que seja de 2003 já está prescrita, então eu não preciso ser perdoado, por que não tenho mais esse débito", explica. Já o advogado Anderson Trautmann Cardoso, especialista em direito tributário do Escritório Veirano Advogados de Porto Alegre, discorda dessa posição. Segundo ele, essas concessões são pontuais e têm pouca possibilidade de ocorrer novamente no futuro. "A MP 449 não é um benefício ao mau pagador, mas sim uma limpeza nos arquivos", informa. Para Cardoso, antes de ser um benefício aos contribuintes, o perdão concedido pela medida é considerado uma reorganização da procuradoria-geral. Por serem muito antigos, muitos destes débitos já estavam "incobráveis". Mesmo assim, o governo continuava a emitir cobranças e tentando executá-las, o que gera custos aos cofres públicos. "Sem dúvida o objetivo da procuradoria é deixar de despender tempo e recursos em processos que não podem mais ser cobrados, e cujo valor é insignificante diante dos gastos feitos para recuperá-los", analisa o advogado.Atualmente, segundo a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, a regra execução fiscal de dívidas com o governo permite que a cobrança seja feita apenas pelo Judiciário. Há, segundo o procurador, três milhões de processos da União somente na Justiça Federal. Para tentar facilitar a cobrança destes débitos, o governo está enviando ao Congresso um projeto de lei que lhe dá mais poder para cobrar as dívidas. A idéia é que os atos preparatórios da execução fiscal - penhora, constrição preparatória de bens e notificação do contribuinte - passem a ser feitos pelo próprio Executivo. A Procuradoria-Geral também está propondo a criação de um Sistema Nacional de Informações Patrimoniais. Outra proposta é a concentração de todas as execuções fiscais e ações em matéria tributária em varas especializadas da Justiça Federal.Padrões de contabilidade brasileiros são alinhados às leis internacionaisOutra importante mudança trazida pela MP 449 foi a adoção de novos padrões contábeis alinhados àqueles utilizados internacionalmente. Antes da edição da medida, empresas e entidades representativas do mercado de capitais e seus participantes vinham debatendo os riscos de elevação da carga tributária em caso de adoção dos padrões contábeis internacionais. Esse temor elevou-se quando tributaristas indicaram que havia de fato risco desse entendimento por parte da Receita Federal em determinadas operações, caso fossem mantidos os termos da Lei 11.638. Essa lei, de dezembro de 2007, alterou e adicionou dispositivos à chamada Lei das S.A. (nº 6.404) e prevê que as práticas contábeis adotadas no País devem seguir o IFRS (International Financial Reporting Standards), padrão internacional de contabilidade, obrigatoriamente, a partir de 2010. "Ela trouxe a convergência da lei societária brasileira para os princípios internacionais de contabilidade e, nesse âmbito, tendo em vista que, principalmente, o imposto de renda tem sua base aferida pelas empresas, seguindo a chamada legislação societária, surgiram dúvidas sobre como essas alterações afetariam os impostos", explica Fernando Giacobbo, sócio da PricewaterhouseCoopers.Um exemplo de atendimento ao novo padrão contábil que poderia gerar questionamentos em termos de tributação antes da edição da MP 449 é o das subvenções para investimentos. Nesse contexto, um terreno recebido de uma determinada prefeitura era contabilizado, anteriormente, na conta de ativo imobilizado e tinha como contrapartida o lançamento no Patrimônio Líquido via reserva de capital. Pelas novas regras, esse mesmo terreno é lançado no ativo e tem como contrapartida ou o passivo ou o resultado, desde que a companhia não tenha obrigação alguma com a prefeitura nessa operação específica.Segundo a nova legislação, o lançamento pode se dar diretamente no resultado, sem ser passível de tributação, desde que não seja usado no cálculo de distribuição de dividendos. A mesma regra deve ser utilizada para o reconhecimento de incentivos fiscais. Essa garantia conferida pela MP 449 é denominada neutralidade tributária, uma vez que ela separa aspectos societários e fiscais na demonstração financeira das empresas.O instrumento que garante a neutralidade tributária é o Regime Tributário de Transição (RTT) e é introduzido pela MP 449. Pelo novo critério, qualquer alteração no lucro contábil da empresa, que seja decorrente do uso dos novos padrões contábeis, pode passar por processo de exclusão, um ajuste de natureza fiscal, reduzindo-se assim a base do imposto. Esse "excedente" excluído do lucro contábil é lançado, então, no Livro de Apuração do Lucro Real (Lalur). A adoção do RTT, conforme a MP 449, é opcional em 2008 e 2009. Em 2010, quando for obrigatória em todo o País a convergência aos padrões contábeis internacionais, será necessária uma outra lei que trate especificamente sobre os efeitos fiscais da Lei 11.638 na contabilidade.GFIP e IPI também são afetados pela alteraçãoCom 58 páginas, a MP 449 também ordena uma série de outras disposições legais. Uma das mudanças que a medida trouxe ao sistema de prestação de contas das empresas está relacionada à Guia de Recolhimento do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço e Informações à Previdência Social (GFIP). "A partir de agora, a apresentação da GFIP passa a ser obrigatória, ainda que não ocorram fatos geradores de contribuição previdenciária", informa Atílio Dengo, professor da Pucrs e doutor em direito tributário pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul. O advogado explica que a declaração passa a se caracterizar como uma confissão de dívida e, portanto, é instrumento hábil e suficiente para a exigência do crédito tributário. Não bastasse isso, a sua não-apresentação impede a expedição da certidão de regularidade fiscal. "Essas modificações são significativas, graves e, especialmente em relação à certidão de regularidade fiscal, de questionável legalidade", alerta.Um dos impostos atingidos pela MP 449 é o IPI, onde mudanças alcançam os débitos de pessoas jurídicas decorrentes do aproveitamento indevido de créditos oriundos da aquisição de matérias-primas, material de embalagem e produtos intermediários, com incidência de alíquota zero ou como "não-tributados", cujos fatos geradores ocorreram até 31 de maio de 2008. O benefício inclui os créditos que estejam mesmo em fase de execução fiscal já ajuizada. Devido à decisão anterior do STF de que os produtos assim classificados não dão direito a crédito, o parcelamento foi instituído para os que se beneficiaram desses créditos possam regularizar sua situação. Nesse caso o pagamento pode ser feito a vista ou em até seis parcelas, com redução de 100% das multas de mora e ofício, 30% dos juros de mora e 100% sobre o valor do encargo legal. Quem optar por realizar em 24 parcelas terá redução de 80% sobre o valor da multas, 30% dos juros e 100% do encargo legal. Já o pagamento em 60 ou 120 parcelas não terá qualquer redução.Em relação ao Refis e Paes, os contribuintes operantes poderão optar pelo pagamento ou parcelamento do saldo remanescente dos débitos consolidados em cada um dos programas nas mesmas condições oferecidas ao parcelamento dos débitos de IPI. Neste caso, dentre outros aspectos, o contribuinte deve avaliar as vantagens da migração e as condições de permanência. Outra inovação polêmica trazida pela MP 449 foi a instituição da "cobrança amigável dos débitos tributários". Segundo os novos dispositivos, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional poderá contratar instituições financeiras públicas para reaver créditos. Para Atílio Dengo, essa medida pode representar "privatização" de dívidas. "Digamos que um banco público, como o BB ou a Caixa, passe a realizar essa cobrança. Esse banco pode oferecer um empréstimo para quitar a dívida. No entanto, se o cliente não puder pagar o empréstimo, então ele cria um novo débito, que desta vez não é mais tributário, mas bancário. Assim a dívida perde toda uma série de garantias que possuía antes e passa a sofrer as regras de pessoas privadas", explica.medida provisória 449


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