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Novo cenário com a Lei Complementar 140

De todos os aspectos disciplinados, destaque-se na lei a distribuição de competências entre os entes federativos.

Era consenso que o país precisava ter uma definição do Poder Legislativo - e não do Judiciário, como vem ocorrendo insatisfatoriamente - sobre as competências dos entes federados em matéria ambiental (União, Estados, Distrito Federal e Municípios). O caminho mais eficaz seria a regulamentação do parágrafo único do artigo 23 da Constituição de 1988 que outorga competência comum a todos os entes federados para adotar ações necessárias à proteção do ambiente.

Finalmente, após 23 anos foi promulgada em 8 de dezembro a Lei Complementar (LC) nº 140, fixando normas para a cooperação nas ações administrativas decorrentes do exercício dessa competência relativa à proteção do ambiente. Bastante aguardada, a pergunta passa a ser se a nova lei possui elementos suficientes para equacionar as dúvidas e reduzir riscos e litígios acerca dos limites de atuação dos órgãos ambientais.

A norma legal ataca os pontos nevrálgicos: a falta de uma postura cooperativa, consensual e transparente entre os próprios órgãos e entre estes e os empreendedores; e a ausência da análise objetiva dos custos e benefícios (equilíbrio entre desenvolvimento e preservação). Merecem louvores os objetivos fundamentais previstos na LC 140 para os órgãos ambientais: a atuação descentralizada, democrática e eficiente; a harmonização de políticas administrativas para se evitar a sobreposição de atuação entre os entes federativos, evitando conflitos de atribuições; e a garantia de uniformidade da política ambiental nacional, respeitadas as peculiaridades regionais e locais.

Quanto aos instrumentos jurídicos para se alcançar a desejada cooperação institucional, a lei apresenta alguns modelos tradicionais, além de uma comissão tripartite (nacional e estadual) e uma comissão bipartite do Distrito Federal. De todos os aspectos disciplinados, destaque-se na lei a distribuição de competências entre os entes federativos.

A nova lei define e reforça a competência dos órgãos ambientais

Acerca do licenciamento sob a responsabilidade da União (leia-se, Ibama), as competências ficaram mais claras e, de certa forma, reduzidas. Compreende os empreendimentos localizados ou desenvolvidos conjuntamente no Brasil e em país limítrofe; no mar territorial; na plataforma continental ou na zona econômica exclusiva; em terras indígenas; em unidades de conservação instituídas pela União; em dois ou mais Estados; de caráter militar e os relativos a material radioativo ou que utilizem energia nuclear.

Aos municípios coube a competência sobre atividades ou empreendimentos que causem ou possam causar impacto ambiental de âmbito local. Por ser um conceito indeterminado, dando margem a interpretações casuísticas, a lei prevê que a atuação municipal deverá ser definida pelos conselhos estaduais de meio ambiente, que considerarão os critérios de porte, potencial poluidor e natureza da atividade.

Como já estabelecia a Lei nº 6.938, de 1981, coube aos Estados a maior fatia da competência em matéria ambiental, esvaziando, de certa forma, a atuação do Ibama. Além de interferir na definição das competências municipais (dizer o que é interesse e impacto local), compete ao Estado a competência residual, aquelas que não estejam conferidas à União nem aos municípios.

Um dos dispositivos mais relevantes da LC 140/11, voltado ao devido processo legal, assegura que os empreendimentos e atividades serão licenciados, ambientalmente, por um único ente federativo. Essa definição já existia em norma expedida pelo Conama (Resolução nº 237, de 1997); contudo não era observada diante de flagrante inconstitucionalidade.

Em havendo interesse dos demais entes federados, os mesmos só poderão se manifestar dirigindo-se ao órgão responsável pela licença, e essa manifestação não será vinculante. Ou seja, a LC 140 visa acabar com os múltiplos processos de licenciamento ambiental.

A lei também traz a procedimentalização da competência supletiva. Quando decorrer o prazo para o licenciamento e o mesmo não estiver concluído, outro órgão ambiental - ou o Conselho do Meio Ambiente - poderá desempenhar as ações administrativas pendentes.

A lei assegura que, em havendo fiscalizações e autuações administrativas simultâneas por suposto descumprimento das normas ambientais, prevalecerá o auto de infração lavrado pelo órgão que detenha a competência para o licenciamento.

A LC 140, se não resolve todos os problemas vivenciados por aqueles que militam na área do direito administrativo e ambiental baliza, ao menos, importantes princípios da ação estatal para o licenciamento de empreendimentos e atividades potencialmente poluidoras.

A nova lei define e reforça a competência dos órgãos ambientais, trazendo, em certa medida, segurança jurídica para a sociedade e para os servidores públicos constantemente acusados de improbidade administrativa ainda que apliquem a lei; unifica o procedimento administrativo de licenciamento ambiental, favorecendo o devido processo legal; e reduz espaços para abusos de agentes estatais sob o rótulo da vetusta e incontrolável discricionariedade administrativa.

Sérgio Guerra é pós-doutor em administração pública pela FGV/Ebape e professor titular de direito administrativo da FGV Direito Rio

Este artigo reflete as opiniões do autor, e não do jornal Valor Econômico. O jornal não se responsabiliza e nem pode ser responsabilizado pelas informações acima ou por prejuízos de qualquer natureza em decorrência do uso dessas informações

 


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