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Estabelecimentos bancários

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Explorar a questão da Responsabilidade Civil no âmbito dos estabelecimentos bancários.

Introdução

O presente artigo tem por objetivo explorar a questão da Responsabilidade Civil no âmbito dos estabelecimentos bancários. Cumpre relembrar que, com o passar do tempo, os serviços oferecidos por tais instituições passaram a compor gama muito maior, deixando de ser unicamente voltados ao comercio de dinheiro ou o depósito de valores.

A questão da responsabilidade civil dos estabelecimentos bancários é pautada na relação de consumo, tendo na maioria das vezes sua origem em contratos bancários. Além disso, questões conflituosas envolvendo estabelecimentos bancários, como quedas em agências, constrangimentos ou até mesmo assaltos demonstram a responsabilidade civil à qual tais instituições estão submetidas.

Nas jurisprudências colhidas por nosso grupo, pudemos ilustrar casos em que houve a responsabilização dos estabelecimentos e as mais diversas interpretações sobre o seu papel diante da sociedade de consumo voltada a produtos bancários. Seguem, para apreciação, primeira jurisprudência, devidamente comentada e sumulas atinentes ao tema em comento.


Comentário ao Acórdão

Recurso de Apelação cível

Processo nº 20053001841-2

Apelante: Banco do Brasil S/A

Apelado: Ronaldo Passos Guimarães

Data do julgamento: 27/03/2009

Ementa: APELAÇÃO CÍVEL. ASSLATO EM ESTABELECIMENTO BANCÁRIO. RESPONSABILIDADE CIVIL. RELAÇÃO DE CONSUMO. DANO MORAL E DANO MATERIAL. QUANTUM INDENIZATÓRIO. SUSPENSÃO DO PROCESSO ATÉ APURAÇÃO FINAL CRIMINAL. PRELIMINAR REJEITADA. PRELIMINAR DE INÉPCIA DA INICIAL, REJEITADA. PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE PASSIVA, REJEITADA. JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE. BENFEITORIAS EM IMÓVEL.

Comentário:

Trata-se de recurso de apelação interposto pelo banco, em razão de ter sido condenado, em primeira instância, ao pagamento de R$ 20.000,00 ao apelado, em caráter de danos morais e materiais, por conta de assalto ocorrido dentro de uma de suas agências. Sendo o Banco do Brasil S/A instituição financeira de enorme poder econômico e assessorada por advogados especialistas no assunto, sabia que não poderia alegar em sua tese de defesa, qualquer modalidade de culpa. Assim, buscou alegar que não ficou comprovado nos autos o dano e o nexo causal, pois estes dois elementos são essenciais para a caracterização da responsabilidade objetiva. Sem eles, não existiria, portanto, o dever de indenizar. Da mesma forma, requereu a suspensão da ação civil, enquanto a penal não fosse concluída.

Nenhuma das alegações do Banco do Brasil foi acatada pela turma julgadora. Para eles, todos os elementos estavam presentes, e devidamente demonstrados nos autos. Restou comprovado nos autos, todos os elementos constitutivos da responsabilidade de indenizar na forma objetiva, quais sejam:

(i) a conduta humana, em razão dos assaltantes fortemente armados terem adentrado o estabelecimento bancário para ali realizarem o crime: (ii) o dano, em razão da perda material sofrida pelo apelado, que teve seus pertences subtraídos, bem como o dano moral em razão de todo o pavor sofrido, ao ver-se indefeso, sob a mira de diversos assaltantes fortemente armados, e que qualquer movimento em falso, poderia lhe custar a vida; (iii) o nexo de causalidade, pois a ação, cometida dentro do estabelecimento, gerou o dano.

Excluída a culpa no caso em tela, pela seguinte razão. No Brasil, adota-se a teoria do risco, disposta no art. 927, § único. Conforme essa teoria,há obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos específicos em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem. Prosseguindo, ensina Maria Helena Diniz que “a responsabilidade civil funda-se num princípio de equidade, existente desde o direito romando: aquele que lucra com uma situação deve responder pelo risco ou pelas desvantagens dela resultantes (ubi emolumentum, ibi ônus; ubi xommoda, ibi incomodda) [1] ”.

Assim, aquele que aufere uma vantagem, deve arcar com a desvantagem. Neste caso, o banco é uma instituição que recebe grandes quantidades de dinheiro, efetua transações em que, em regra, lucra sobre eles. Assim, diante do intenso e frequente fluxo de dinheiro e valores, sua atividade gera riscos para todos que ali estão, a até mesmo para os que de suas instalações saem, mas este, não é o objeto deste estudo.

Aduz o artigo retro citado o termo “nos casos previstos em lei”. Assim, a responsabilidade objetiva dos bancos está devidamente instituída na Lei nº 7.102/83, que dispõe sobre segurança para estabelecimentos financeiros, estabelece normas para constituição e funcionamento das empresas particulares que exploram serviços de vigilância e de transporte de valores, e dá outras providências.

Não apenas o caráter legal do banco como instituição financeira estabelece a sua responsabilidade objetiva de indenizar, mas como sua atividade funcional, estabelecida nos artigos 3º, § 2º[2] e  14[3] do Código de Defesa do Consumidor.

Assim, caracterizada está a responsabilidade civil objetiva do Banco do Brasil S/A, pois lei específica determinada que à ela cabia a segurança do estabelecimento, sendo que esta, falhou. Ademais, o código de defesa do consumidor, por sua natureza, inverte o ônus da prova, e por esta razão, no banco não conseguiu se eximir, de nenhuma forma, de sua responsabilidade.

Também, de forma a retardar o prosseguimento da ação cível, buscou a instituição financeira a suspensão do processo até o término da ação penal. Porém, como bem decidido pela turma, ambas são independentes. A prova da materialidade estava amplamente configurada, e portanto restava tão somente, a prova da autoria. Como a autoria, para o caso em tela, em nada produzirá efeitos, foi negado o pedido de suspensão, com base no artigo 935 do Código Civil.


3.   Enunciados – Jornadas de Direito Civil

Jornadas de Direito Civil I, III, IV, e V

Enunciado 38 - Art. 927: A responsabilidade fundada no risco da atividade, como prevista na segunda parte do parágrafo único do art. 927 do novo Código Civil, configura-se quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano causar a pessoa determinada um ônus maior do que aos demais membros da coletividade.

Enunciado 37 – Art. 187: A responsabilidade civil decorrente do abuso do direito independe de culpa e fundamenta-se somente no critério objetivo-finalístico.

Enunciado 43 - Art. 931: A responsabilidade civil pelo fato do produto, prevista no art. 931 do novo Código Civil, também inclui os riscos do desenvolvimento.

Enunciado 45 – Art. 935: No caso do art. 935, não mais se poderá questionar a existência do fato ou quem seja o seu autor se essas questões se acharem categoricamente decididas no juízo criminal.

Enunciado 46 – Art. 944: A possibilidade de redução do montante da indenização em face do grau de culpa do agente, estabelecida no parágrafo único do art. 944 do novo Código Civil, deve ser interpretada restritivamente, por representar uma exceção ao princípio da reparação integral do dano[,] não se aplicando às hipóteses de responsabilidade objetiva. (Alterado pelo Enunciado 380 – IV Jornada)

Enunciado 47 – Art. 945: O art. 945 do novo Código Civil, que não encontra correspondente no Código Civil de 1916, não exclui a aplicação da teoria da causalidade adequada.

Enunciado 48 – Art. 950, parágrafo único: O parágrafo único do art. 950 do novo Código Civil institui direito potestativo do lesado para exigir pagamento da indenização de uma só vez, mediante arbitramento do valor pelo juiz, atendidos os arts. 944 e 945 e a possibilidade econômica do ofensor.

Enunciado 50 – Art. 2.028: A partir da vigência do novo Código Civil, o prazo prescricional das ações de reparação de danos que não houver atingido a metade do tempo previsto no Código Civil de 1916 fluirá por inteiro, nos termos da nova lei (art. 206).


4.      Súmulas

4.1. Súmula 54

Órgão Julgador: CE - CORTE ESPECIAL

Data do Julgamento: 24/09/1992

Data da Publicação/Fonte: DJ 01/10/1992 p. 16801RSTJ vol. 38 p. 369RT vol. 688 p. 171

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Enunciado

Os juros moratorios fluem a partir do evento danoso, em caso de responsabilidade extracontratual.

4.2. Súmula 297

Órgão Julgador: S2 - SEGUNDA SEÇÃO

Data do Julgamento: 12/05/2004

Data da Publicação/Fonte: DJ 09/09/2004 p. 149 RSSTJ vol. 23 p. 243 RSTJ vol. 185 p. 666

Enunciado

O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras.

4.3. Súmula 328

Órgão Julgador: CE - CORTE ESPECIAL

Data do Julgamento: 02/08/2006

Data da Publicação/Fonte: DJ 10/08/2006 p. 254 RSTJ vol. 27 p. 125 RSTJ vol. 203 p. 559

Enunciado

Na execução contra instituição financeira, é penhorável o numerário disponível, excluídas as reservas bancárias mantidas no Banco Central.


4.4. Súmula 479

Órgão Julgador: S2 - SEGUNDA SEÇÃO

Data do Julgamento: 27/06/2012

Data da Publicação/Fonte: DJe 01/08/2012 RSTJ vol. 227 p. 937

Enunciado

As instituições financeiras respondem objetivamente pelos danos gerados por fortuito interno relativo a fraudes e delitos praticados por terceiros no âmbito de operações bancárias.


Conclusão

A análise da jurisprudência, das súmulas e dos enunciados trazidos a nosso conhecimento ao longo deste estudo nos permite obter algumas conclusões: a relação de consumo que pauta clientes e estabelecimentos bancários abrange os fatos mais diversos que podem se passar dentro do âmbito bancário. Dessa forma, pode-se entender que o instituto da Responsabilidade Civil em tais situações é sempre pautado nos direitos dos consumidores e na hipossuficiência dos clientes diante da contraparte, as instituições financeiras.

Aprofundando, ainda, mesmo que não tenham participação direta no dano causado, os estabelecimentos respondem de maneira objetiva por ele, demonstrando novamente a abrangência da responsabilidade civil nessa espécie de relação de consumo e comércio. A penhorabilidade de seus bens diante de execuções demonstra que uma grande atividade legislativa para proteger a clientela bancária, que está sujeita a uma diversa gama de riscos, em conformidade com a igualmente extensa quantidade de serviços prestados.


Bibliografia

MOTTA, João Antônio. Os Bancos no Banco dos Réus.Editora América Jurídica, Rio de Janeiro, 2001.

NETO, Eduardo Salomão. Direito Bancário. Editora Atlas S.A, São Paulo, 2007.

DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. Vol. 7, 27ª Ed., Editora Saraiva, 2


Notas

[1] DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro. São Paulo: Editora Saraiva, 2004, v.7, p.48.

[2]  Art. 3º: Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços.

§ 2º Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista.

[3] Art. 14 da Lei nº 8.078/90: O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.

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Sobre os autores
Carla Kalim

Estudante da Universidade Presbiteriana Mackenzie

Bruna Vasconcelos Monteiro

Estudante de Direito da Universidade Presbiteriana Mackenzie

Priscila Gianotti

trabalha em banco, estudante de direito

Vitoria Nakandacare Guimarães

Estudante de direito na Universidade Presbiteriana Mackenzie

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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